O câncer caracterizado como doença exige complexo tratamento,
que por vezes acaba sendo devastador ao organismo, comprometendo a sexualidade
humana. Fisiologicamente, tanto as alterações de alguns tipos de câncer, como o
intenso tratamento quimioterápico que provoca nos diferentes sistemas orgânicos
acabam por comprometer a sexualidade e a função sexual dessas pessoas.
A sexualidade deve ser entendida conforme 3 dimensões –
biológico, psicológico e social – inter-relacionados e inseparáveis. O
biológico considera a capacidade do individuo dar e receber prazer sexual,
englobando o funcionamento dos órgãos sexuais e a fisiologia da resposta sexual
humana – desejo, excitação e orgasmo. A dimensão psicológica leva em
consideração a auto-imagem sexual, caracterizada pelas imagens que as pessoas
têm de si mesmas como homens e mulheres, tendo como influência a imagem
corporal (imagem mental do eu físico). Já o social envolve o papel social de
gênero, o comportamento segundo a expectativa dos grupos em que esta pessoa
está inserida, e o papel sexual, modo como se mostra, a sensação de se sentir
homem ou mulher. Nesta relação com o meio, além do comportamento sexual,
deve-se levar em consideração o relacionamento sexual.
As alterações que podem acontecer na sexualidade são tratadas
no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, DSM IV-TR e pela
Classificação Internacional de Doenças, o CID-10. Quando o paciente é submetido
a um tratamento ideal, e reafirmamos a importância do trabalho
transdisciplinar, os efeitos do problema se tornam menos significativos.
Referente à fisiologia da resposta sexual humana, os
pacientes oncológicos mencionam problemas relacionados à fase do desejo sexual,
da excitação sexual e do orgasmo. A
diminuição do desejo pode ser influenciada tanto por fatores orgânicos, como
também por fatores psicológicos. Os orgânicos estão relacionados,
principalmente, a diminuição da testosterona decorrente do tratamento quimioterápico
e também pela falta de disposição resultante da anemia vivenciada pelos
pacientes e pela presença constante de náuseas e vômitos. O constante
sofrimento, medo e preocupação decorrente da doença e do tratamento
caracterizam os fatores psicológicos.
Os problemas na excitação sexual masculina também estão
influenciados pela diminuição da testosterona e pela própria doença, em
decorrência da anemia que acaba alterando o mecanismo vascular da ereção e do
fator emocional negativo presente. Fisiologicamente, em 2 ou 3 semanas após a
aplicação da quimioterapia o nível de testosterona pode ser revertido. Com
relação as mulheres, o principal problema na fase de excitação sexual é a falta
de lubrificação vaginal decorrente da diminuição de estrógeno. A queda nos
níveis do hormônio estrógeno é consequência do tratamento quimioterápico, cujas
manifestações clínicas incluem a diminuição da umidade vaginal e, em raros
casos, a redução do diâmetro vaginal.
Na literatura cientifica não há indícios de que a
quimioterapia possa provocar alterações na fase do orgasmo, por só ocorrer na
presença de efeitos neurológicos que atinjam os nervos regentes do reflexo
orgásmico. Contudo, esta fase pode ser comprometida pela presença de dor no ato
sexual ou pelo bloqueio emocional provocado pela própria doença.
Os aspectos psicológicos que envolvem a sexualidade dos
pacientes, ou seja, que se relacionam com a auto-imagem sexual, frequentemente,
fazem parte das queixas apresentadas. A mudança da auto-imagem corporal é mais
um dos efeitos indesejáveis do tratamento. Além do mais, essas mudanças
provocam preocupações quanto a aceitação social dessas pessoas.
Por conta do quadro clínico, muitos pacientes se tornam mais
vulneráveis a infecções, levando-os a se proteger com o uso de preservativo
durante a relação sexual, o uso de mascaras em determinados locais e situações,
havendo isolamento hospitalar em alguns casos e até mesmo restrição ao beijo. Isto
tudo acaba interferindo no comportamento sexual do paciente não só durante a
relação, mas também na maneira de expressar sua sexualidade.
A possibilidade de não gerar filhos é outra dificuldade que
remete ao sentimento de culpa, pela infertilidade do casal e pode atrapalhar o
relacionamento sexual. É importante que os parceiros expressem seus sentimentos
sexuais um ao outro, sem esperar que o outro descubra suas ansiedades e
necessidades, pois o medo da insatisfação do parceiro e do enfrentamento da
relação podem estar relacionados à falta de comunicação entre o casal. Prova
disso é o relato de pacientes que referem que o relacionamento sexual melhorou
após a doença, por se sentirem mais valorizados pelo parceiro. Talvez aí a
diferença seja apenas o fato do relacionamento ter se tornado mais sólido e
haver mais comunicação e cumplicidade entre o casal...
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